sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Marco Antônio

Por muito tempo fugia da hipótese de se encontrar sozinho aonde estava: linha do metrô; à espera do próximo; 15 horas.
Costumava estar ali sempre acompanhado. Tudo agora não passava de ruídos, fragmentos de olhares, timbres que seus sentidos ainda captavam. Até a solidão invadir sua vida e lhe fazer companhia, nunca havia reparado o quão aquele ambiente cheio de gente, odores, vozes o reportavam para uma atmosfera completamente vazia dentro de si.
Antes que pudesse se lembrar de olhar para o relógio em seu pulso, sentiu a brisa trazida pela chegada do metrô. Fechou os olhos e viu flash's, lembranças dos cabelos longos e castanhos esvoaçando perto do seu rosto, levando o cheiro de xampoo cítrico até suas narinas. Abriu os olhos e percebeu que estava sendo empurrado por um certo número de pessoas afobadas para adentrarem no vagão.
Apesar da correria ao redor, não precisou apressar os passos e entrar na disputa para conseguir um banco vazio ao lado da janela que, mesmo revelando apenas as paredes escuras do mundo subterrâneo de São Paulo, ainda levavam sua preferência.
Tirou o celular do bolso e observou a própria imagem refletida através do visor do pequeno aparelho. Foi obrigado a concordar que a nova armação que comprara para seu óculos o deixara mais velho. De 40 anos, naturalmente confundidos com 50 (devido aos cabelos e barba grisalhos), passou a 60.
Após alguns instantes, ouviu a voz grave do locutor avisar os passageiros da próxima estação e o lado do desembarque. Levantou-se preparado para descer. Não o fez. Apenas colocou a cabeça para fora do vagão como se estivesse procurando por algo. Não o encontrou. Ouviu o sinal de que as portas estavam prestes a fechar e voltou a cabeça para dentro, para cutucar os restos de cola dos avisos colocados nas paredes daquele ambiente carregado de luz e sombras. Repetiu essa mesma ação em cada parada; de estação em estação com a mesma inquietude.
Tudo o que tinha eram algumas viradas de cabeça, rápidas percorridas com o olhar e a esperança empobrecida de encontrar o que procurava.
Finalmente, desceu na última estação da linha verde. Ali permaneceu por muito tempo. Uma; duas horas, talvez. Finalmente encontrou o que desejava: a linda jovem dos cabelos de odor cítrico. Fazia tempo que não a via pelo metrô, ela estava de férias do trabalho. Era empregada doméstica, beirava os 20 anos e cursava enfermagem no período noturno.
Ele, que contentáva-se apenas com a presença (ainda que desconhecida) da jovem, não sentiu-se mais só. Gostava de reparar em cada detalhe nela contido: os olhos com cílios tão castanhos e grandes quanto os cabelos, a pinta debaixo da pálpebra e os seios redondos e acesos por de trás da camisa branca.
A acompanhou até sua casa sem que ela percebesse. Quando a viu cruzar um portão enferrujado, pensou que amanhã ele haveria de dar o próximo passo para consegui-la. Quer ela quisesse ou não.

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